-Srtª
Winchester_ a voz da governanta despertou Isabella de seu devaneio_ o repórter
a espera na sala de estar.
-Obrigada
srª Jacobs, já estou indo.
Quando
a governanta deixou o escritório, Isabella guardou na gaveta as várias
fotografias que espalhara pela escrivaninha e foi ao encontro do repórter. A
jovem senhorita Winchester se tornara uma escritora de sucesso em pouco tempo,
publicando a trilogia “A imortal”, sobre a vida e os trágicos romances de uma
vampira.
O
repórter sorriu ao ver a escritora, ela era uma bela mulher de longos cabelos
ruivos, olhos azuis, lábios rosados e corpo esbelto. Ela se aproximou e os dois
apertaram as mãos.
-Srtª
Winchester, sou David Jackson, do The New York Times.
-Pode
me chamar de Bella.
-Ok,
Bella_ ele disse seu nome como se
saboreasse a palavra e ligou o gravador. Como surgiu a ideia de “A imortal”?
-Tudo
nasceu de um sonho, então a história criou vida e teve vontade própria.
-Helen,
a protagonista, começa como uma jovem doce e sonhadora, então se torna amarga e
termina deprimida. Durante toda a história ela busca e luta por amor, mas acaba
sozinha na eternidade. O primeiro amor a abandona e o segundo morre. É um final
triste, dá a impressão de que não vale a pena lutar por amor. É nisso que você
acredita?
-Quando
se tem que lutar por alguém como Adam, realmente não vale a pena. Mas por
Benjamin sim. Adam queria diversão e eternidade, Benjamin queria uma família e
Helen queria apenas amor._ um nó se formou na garganta de Bella e ela respirou
fundo para continuar_ Mas todos procuraram no lugar errado.
-Adam
e Benjamin procuraram algo em Helen, era ela o lugar errado?_David
arrependeu-se da pergunta ao ver que a escritora o fuzilou com o olhar.
-Se
Adam queria diversão, não devia ter casado, muito menos com uma humana. Se
Helen queria amor, não devia ter aceitado um homem frívolo nem atendido ou
perdoado seus caprichos. Se Benjamin queria uma família, não era com uma
vampira que conseguiria. Mas a vida é assim, as pessoas cometem erros e Helen
teve a eternidade para arrepender-se dos seus.
-Ela
também se arrepende do tempo que viveu com Benjamin?
-Não,
_Bella sorriu_ ela amou muito o lobisomem e com ele foi feliz como jamais foi
com o vampiro. O amor que Helen tinha por Benjamin foi tão grande que, mesmo
incapaz de morrer, ela absteve-se da vida. Deitou-se ao lado do leito eterno de
seu amado e, pela primeira vez em duzentos anos, ela dormiu. Dormiu para não
viver em um mundo onde Benjamin não mais vivesse.
-Você
fala desse amor com tanta ternura... Benjamin foi inspirado em alguém em
especial?
-Todos
eles representam pessoas reais.
-Então
a trilogia é inspirada em uma história real e não em um sonho?
-O
fato de ser inspirada em uma história real, não exclui o sonho, afinal foi de
um sonho que nasceu a magia e a imortalidade.
-Assim
como Helen, você é órfã e cresceu sob os cuidados de um tio. Há mais alguma
coisa em comum entre vocês?
-Tantas
que eu não poderia dizer. Quando escrevi a Helen, lhe emprestei meu coração e
minha alma, nós duas temos algo da outra.
-Dividiriam
a mesma história triste?
-Você
acha que casei com um vampiro, _Isabella brincou_ depois com um lobisomem e que
agora estou adormecida em um mausoléu? _os dois riram_ Acho que muitas pessoas
poderiam se identificar com a história da Helen.
-Sim,
certamente. Mas e você, Isabella Winchester, se identifica com a história?
A
escritora tentou disfarçar, mas David percebeu que a pergunta a deixara tensa.
Um segundo depois ela sorriu e falou:
-Passei
tanto tempo escrevendo “A imortal” e pensando como Helen, que era como se eu
vivesse cada momento da história, poderia até mesmo dizer que vivi. Senti cada
sorriso, lágrima, dor, medo, esperança, saudade... Senti tudo o que Helen
sentiu.
-Você
parece estar se esquivando da minha pergunta.
Novamente
Bella fuzilou o repórter com o olhar, mas tentou não parecer irritada quando
respondeu.
-Não
estou me esquivando. O que eu quis dizer é que quando alguém se envolve de
verdade com uma história ela se identifica. A maioria das pessoas já teve pelo
menos uma desilusão amorosa ou uma grande perda, e histórias assim trazem à
tona esses sentimentos.
Nada
que Bella dissesse faria David mudar de ideia, ele estava certo de que “A
imortal” se tratava da história da autora com várias metáforas. -E quanto ao amor? Helen se mostra muito
intensa quando o assunto é amor, assume qualquer risco. Você é como ela ou
prefere ir mais devagar?
A
autora achou que aquele repórter era um bocado curioso, mas respondeu mesmo
assim.
-Já
fui tão intensa quanto ela, mas agora vou devagar com o amor. Esse pode ser um
território bem perigoso.
A
nova informação era um prato cheio para a insaciável curiosidade de David, que
não demorou a disparar:
-Então
você já teve uma desilusão tão grande quanto a de Helen.
Não
era uma pergunta e isso deixou Bella mais irritada. Ela teve que respirar fundo
antes de falar.
-Não
vou negar, nem contar detalhes, foi há muito tempo.
-Todos
os meses você leva flores ao cemitério e as deposita em três túmulos. Dois
deles são dos seus pais, e o terceiro?
Esta
foi a gota d’água, Isabella já não suportava a impertinência do repórter, mas
ela não seria grosseira.
-Sr.
Jackson, acredito que já desviamos o suficiente o foco da entrevista.
-Desculpe.
Pela
primeira vez David pareceu desconsertado, e a escritora gostou disso. O
repórter arrumou seus óculos enquanto buscava na mente a próxima pergunta e só
então Bella notou que seus olhos eram verdes. E mesmo que ela não admitisse, se
sentiu atraída por ele.
David
era alto, loiro e bonito, os óculos lhe davam um ar intelectual. A autora teve
que afastar o pensamento de que ele seria namorável se não fosse tão curioso.
Por fim ele quebrou o silêncio.
-O
fim da saga foi um tanto surpreendente para os fãs, todos esperavam que Helen
tivesse um final feliz. Este final seria a possibilidade para uma continuação?
-Desde
o começo Helen sabe que morrerá de um mal incurável e não deixará descendentes,
uma cigana prevê seu futuro. Mas a morte que a cigana fala é uma metáfora,
afinal a vampira tem toda a eternidade pela frente, mesmo que adormecida. E não
nego que um dia possa haver uma continuação, mas não é uma certeza.
-Os
fãs torcem por uma continuação.
Ao
fim da entrevista, os dois se despediram formalmente. Mas aquela conversa
dominaria os pensamentos deles por um bom tempo.
Gabriela G. Bastos
A vida de Sangue&Alma